O Oráculo de Brahma

-O que é vencer na vida, Eduardo? Isso nem existe. Somos todos vencidos pela morte.

Ele dizia isso como se fosse obra de uma grande inspiração sua. Algum escritor russo já o dissera sabe-se lá duzentos anos atrás; e ele deve ter ouvido de algum outro bêbado. Ninguém liga. As afirmações com a cabeça em uma mesa de bar são tão gratuitas quanto as filosofias para às quais ninguém sequer dirigiu a palavra.

Penso, contudo, nessa baboseira sempre entoada na voz trôpega dele toda vez que questiono minhas capacidades, minhas obras, minhas paixões e minhas certezas, afinal. É incrível como a sabedoria pode-nos sair tola mesmo da boca dos mais sábios e sábia mesmo da boca dos mais tolos- tudo depende de boa-fé.

Ando sem fé. Da boa e da ruim. Torço para que tudo dê certo para ele, mais do que para mim bem na verdade, pois nem gosto tanto assim de mim. Torço para que tudo que fala dê errado, pois fala muita besteira e também não gosta de si próprio.

Trôpega voz. Que saudade dela!

Ficou o conselho sábio de um tolo que bebia demais.

Olho para o copo sempre cheio de ânsia para encher-se de novo. Custo acreditar que não foi o garçom, mas quem ousaria tocar o copo de um homem? Que esteja meio-cheio ou meio-vazio. Que importa? Ninguém toca o copo de ninguém: essa é a única e sagrada regra de convivência do bar.

Uma sábia regra que sucede da necessidade de o copo ficar só de vez em quando, mesmo que em meio a tantos outros.

Bebo. Que insucesso! Beber antes das 18h numa segunda-feira porque não se consegue voltar para casa e para a sua solidão cogente, geminada.

Bebo ao sucesso dos que se foram, pois vencer nem sempre é bom. Estar certo pode ser insuportável.

Ele continuava:

-Veja você! Você tem família que o ama, tem dinheiro, tem saúde. Mas e daí? Você também está como nós.

Sentado ao Oráculo da Brahma, tinha de ouvir ao cego que sempre estava certo e que está certo mais uma vez. E não o está por mal.

Hoje o Oráculo está aberto, mas sem clientes, ou seja, definha, chafurda enquanto todos andam tão certos do que fazer. Nascem umas beladonas no altar da abandonada sabedoria arcana dos bêbados

Vejo um rapaz aproximar-se.

-Você é jovem, Adenor! Levante-se e anda antes que acabe aqui neste purgatório que não vale mais que o Inferno!